terça-feira

Ai, que eu amo este homem!

“Tenho a alma num estado de rapidez ideativa tão intenso que preciso fazer da minha atenção um caderno de apontamentos, e, ainda assim, tantas são as folhas que tenho a encher, que algumas se perdem (…)”




Fernando Pessoa, in Diário Popular, 28-XI-1957

domingo

PB

Que rocha é essa que temes em segurar,
Cruz de pau que Deus te deu a carregar,
Ausência de vento em ruga marcada,
Vertem se lágrimas em cara lavada.

Que abraço é esse que aquece o tempo,
Entrelaçar dos véus num breve momento,
Choras as dúvidas que a vida te mostrou,
Espetos no caminho com que Ele te fadou.

E se é nas horas que vives a mágoa,
Que congelam os olhos quentes de água,
Seguras a mão de quem te solta do pesadelo,
"Apanha todas as pedras, um dia contróis um castelo".

terça-feira

Areia lunar

Caio no areal como sombra imersa,
Areia fina entregue aos meus,
Sobrevivo na cruz de uma alma adversa,
No mesmo sonho que o dele e os teus.

De que me serve essa areia de desventura,
Se a tudo o resto me guardei,
Se é sonho o meu então eterno dura,
É nesse sono a que depressa regressei.

Triste mesmo é viver numa casa,
Descontente com o mesmo "lar",
Neste sonho é o bater de asa,
Planar sobre pedras e flores e arrasar no mar.

Triste de quem não é feliz,
Porque reclama uma vida dura,
Nada na minha alma assim o diz,
O ser se na vida é obra na sepultura.

À minha temperatura normal

Hoje não há nada para perceber. Sabem das coisas, todas, como se fosse a última.
Sobem litradas de bancadas, de flores na mão, como se fossem ao encontro de uma qualquer alma. Lado esquerdo, lado direito, mil cabeças, ping-pong. Nem te olha, não te vê, e tu suas enquanto sobes.
Depois vêm velhas medidas, não há cá o quilograma. Pesam te as pernas e mais suas, mais sobes, menos te vê. Corres como carteiro. Esse chega só ás 2. E suas. Sobes. Desapareces.

domingo

"I know not what tomorrow will bring..."








by FP

I´m so sorry...

...IF I DON'T GIVE A SHIT!!!




And please, don't trust my lyrics.

quinta-feira

As ondas do Guincho.

Que costa essa onde elas se contam,
Onde se perdem tranquilas ao achar,
Fogem seguidas e não se encontram,
Rebentam batidas à beira-mar.

Não se vêm em formas de X surgindo,
Som que nos meus ouvidos persiste,
Seguidas de marés elas vão existindo,
Ondulação de mar que a vista assiste.

Na areia fria onde o mar insiste,
Em cor quente de sabor salgado,
Secas a pele e o que dela consiste,
Queimas o mais nobre corpo delgado.

E do abismo de onde a água se ergue,
Não há sinais de ilha remota,
Violência santa que só ele consegue,
Viver em seu corpo é saborosa derrota.

Às Pês

O braço esquerdo é recuado,
O outro direito anda mais cansado,
As pernas finas num ângulo disposto,
Os olhos pintados marcam o rosto.

Olhar esfíngico de femme fatal,
Andar vadio que não há igual,
Toldam se nela românticos cabelos,
Descansa eterna sobre os cotovelos.

Como os deuses que vendem e dão,
Meta alcançada em sonhos de ilusão,
Assim acalmas a tua alma vasta,
Dormes na noite numa paz que te basta.

terça-feira

Dor no joelho

Limita-se a mudar, desligar telefones, sinais de fumo, entupir a caixa do correio com papel para não caber mais nada, nem o ar lá entra e o fundo deixa de se ver.

O querer correr todas as manhãs até ao final da tarde, de costas ou de lado, tudo menos de gatas, aí doí nos ossos.
Desactivar contas, largar o relógio em cima da prateleira até que a pilha se acabe. Tic Tac. shiuuu.

Chave na porta, está ao contrário, abre se para a direita e vais direita à parede.
Arrumar a roupa que se acumulou durante um mês de ausência da cama, da nossa cama, mudar os lençóis.

Mudam-se os lençóis e muda se a cor, o cheiro de outro corpo entranhado e que se sabe que ali não se volta a deitar. Queimam-se as fronhas num panelão, aqui não voltas cabrão! Aqui não voltas...

Levantar o colchão para entalar novos lençóis.
Traaaasssssss...
Porra, outra vez não!

Decisão de descanso, sem noitadas, sem fumo de cigarros.
Afastar uma tonelada de madeira...o joelho direito sai do sitio, dor agonizante com direito a grito isolado, suor amarelado, dor equivalente ao tiro no peito.

A mudança dói, no corpo e na alma.

Marta

Qualquer coisa assim bonita,
Multidões que dão vida infinita,
Felicidade completa no encontrar,
Vida que não se deixa mostrar.

E assim dão voltas de veias humanas,
Montados em lendas gregas ou romanas,
De meninisse perdida ao achar,
Uma vida por duas ao acordar.

Se o teu sangue hoje é o meu,
Perdido em carne que Deus nos deu,
Então que assim seja a sua vontade,
Mais vale agora do que mais tarde.